sexta-feira, 25 de junho de 2010

Ofício em extinção

Ali, na avenida Manoel Ribas – coração do desenvolvimento de União da Vitória – entre luminosos resplandecentes, há uma discreta e mediana placa com um simples anuncio: Alfaiataria Príncipe : roupas a pronta entrega e sob medida. Ao entrarmos é como se o tempo não estivesse avançado. Balcão de imbuía e armários cheios de corte de tecidos. Tudo é antigo e precioso. Quem nos recebe com uma hospitalidade de dar inveja a qualquer bom comerciante é o alfaiate Erico Clementino da Silva.
Sentado em frente a antiga máquina de costura, ele estava envolvido na costura de um casado de lã (forrado com entretela e crina, como ele mesmo conta). Vestido com um casaco preto, confeccionado pelas suas próprias mãos e uma gravata azul clara que ao olhar mais atentamente parecia um tom acinzentado, ele rapidamente se dispôs a relatar sua profissão.
No dicionário, alfaiate é o profissional especializado que exerce o ofício da Alfaiataria, uma arte que consiste na criação de roupas masculinas (terno, costume, calça, colete, etc.) de forma artesanal e sob medida, exclusivamente de acordo com as medidas e preferências de cada pessoa, sem o uso padronizado de numeração preexistente.
Além de Erico, quem nos auxilia a costurar esta reportagem é Renato Ruschel. Ambos, perpetuam em União da Vitória e Porto União o delicado e habilidoso trabalho de esculpir em tecido, as múltiplas formas humanas. Erico e Renato são os únicos alfaiates em atividade. Uma profissão que teve seu auge na primeira metade do século passado ,e, hoje resiste discreta em meio ao cenário evolutivo do século XXI.

No auge....
Para conversar com Erico e Renato não é preciso fechar os olhos para recuar no tempo. Aliás, é preciso ficar de olhos bem abertos para observar o brilho no olhar dos alfaiates que, mesmo aposentados, continuam na labuta, vestindo com elegância os apreciadores de um traje refinado.
Filho de uma dona de casa e um comerciante, Erico após a morte do pai foi aprender um oficio. “Isso foi em 1953. Naquela época a gente não tinha muita opção de emprego. Aí comecei como aprendiz na alfaiataria Adonis”. A época era próspero na profissão. Homens e mulheres da sociedade embalavam suas tardes no Clube Concórdia ou Clube Apolo. O traje para os homens obrigatoriamente era o terno. “Era assim também para ir a igreja, cinema e até para se trabalhar em banco”.

A extinção
Casado e pai de dois filhos que não seguiram a profissão do pai, Erico mantém seu ateliê com fregueses fixos. “Sempre tem aqueles que preferem um bom terno sob medida. Tenho clientes de senhores a jovens”.
Com a mesma maestria que rege as agulhas e a máquina de costura ele explica a diferença entre um terno sob medida e um comprado a pronta entrega. “Os ternos feitos a mão, são forrados com entretela e crina. São de lã e tem bolsos internos. O a pronta entrega é de um tecido mais fino e praticamente todos os seus detalhes são feitos na máquina”.
Perguntado se acredita que futuramente sua profissão era desaparecer ele é rápido em responder. “O alfaiate tende a ser um oficio extinto devido a evolução. Na verdade é um ciclo evolutivo natural”.

Na memória de Renato Ruschel....
O ateliê de Renato fica no centro de Porto União em uma rua menos movimentada que a Manoel Ribas. Foi ele que nos auxiliou na garimpagem dos nomes dos alfaiates estabelecidos nas Gêmeas do Iguaçu. Até que achasse que nenhum foi deixado de lado, foram mais de quatro ligações. Quando o telefone tocava: “Ana, me lembrei de mais um. Não podemos deixar ninguém de lado”.

Dupla realização
Assim como Erico, Renato também foi aprender o oficio após a morte do pai. “Aos 14 anos minha mãe me levou para ser aprendiz na alfaiataria Mailim, do lado do laboratório do Willinho Jung. No começo eu não gostava muito, mas depois fui pegando o gosto. Para aprender a se fazer um paletó se leva quatro anos, por isso, fiz meu primeiro paletó aos 18 anos”.
Lá se vão 61 anos de profissão e desde 1960, Renato tem um ateliê próprio. Ele define seu oficio como uma das profissões mais difíceis. “Tem um grande estilista que afirma que o corpo humano é semelhante as folhas. Ela são diferentes umas das outras. Assim é com o nosso corpo. Nenhum é igual”.
Enquanto puxa na memória os nomes dos alfaiates que fizeram nome em nossas cidades, ele mostra um livro escrito pela professora Therezinha Leony Wollf onde está eternizado o tradicional encontro dos alfaiates no dia que no dia 6 de setembro, Dia do Alfaiate. “A maioria deles já faleceu. Os que estão vivos deixaram de trabalhar”.
Parar de trabalhar é o que Renato não pensa em fazer. Apesar de também crer que o oficio está em extinção devido a modernização, ele afirma que encontro estiver vivo vai continuar a alinhavar muitos trajes. “Como alfaiate eu me realizei pessoal e profissionalmente. Enquanto eu estiver aqui vou continuar”.


Texto da jornalista e amiga Ana Carol, para o Jornal O Comérico - edição 26.06.2010
Adorei o texto, na verdade os textos da Ana são adoráveis mesmo, jornalismo literario sempre...adooro

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